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Quarta, 08 Abril 2020 10:13

Experimente Fazer uma Páscoa Diferente

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Experimente Fazer uma Páscoa Diferente

É a primeira vez que vamos comemorar a Páscoa em meio a uma pandemia, a do novo Coronavírus. E nem por isso vamos deixar de fazer aquele tradicional almoço de Páscoa, ainda que seja apenas com nossa família “encolhida” (pais e filhos).

Tá ai uma grande oportunidade que Deus nos deu de celebrar a Páscoa de um jeito diferente, como nós nunca fizemos antes.

Aqui vão algumas ideias, dicas e sugestões para ajudar você a fazer uma Páscoa diferente e ter uma experiência muito mais significativa e inesquecível.

O Sentido Original da Páscoa

A coisa mais importante para fazer e experimentar uma Páscoa diferente e significativa é conhecer o seu sentido mais profundo.

É bastante comum a compreensão de que Páscoa quer dizer passagem. E é isso mesmo. Mas precisamos perguntar: passagem de quem ou do que.

Muitos afirmam que é a passagem do estado de morte para o estado de vida, devido à ressurreição do Senhor, e isto está correto. Contudo, o significado original da Páscoa deve ser buscado em Êxodo 12.1-28, onde encontramos a narrativa da instituição da Páscoa. Essa busca nos ajudará a elaborar uma Páscoa diferente e significativa.

O entendimento de que Páscoa significa passagem tem sua origem na sua raiz verbal, que expressa a passagem de Deus sobre as casas no Egito na noite da morte dos primogênitos. Este verbo passar sobre aparece três vezes na história da primeira Páscoa.

1. Êxodo 12.13

Mas o sangue nos batentes das portas servirá de sinal e marcará as casas onde vocês estão. Quando eu vir o sangue, passarei por sobre aquela casa. E, quando eu ferir a terra do Egito, a praga de morte não os tocará. (Êxodo 12.13)

Esta é a primeira vez que se usa este verbo na Bíblia.

2. Êxodo 12.23

pois o Senhor passará pela terra para ferir mortalmente os egípcios. Mas, quando ele vir o sangue nas laterais e no alto da porta, passará por sobre aquela casa. Não permitirá que o anjo da morte entre em suas casas para matar vocês.

É muito interessante notar nesse texto que há dois verbos diferentes para passar. O primeiro (grifado), no início do versículo, tem o sentido de “atravessar”, neste caso, passar dentro da casa dos egípcios. O segundo verbo (em negrito) é o mesmo usado em Êxodo 12.23, e quer dizer passar sobre as casas marcadas com sangue, poupando os primogênitos daquela moradia.

3. Êxodo 12.27

e vocês responderão: “É o sacrifício da Páscoa para o Senhor, pois ele passou por sobre as casas dos israelitas no Egito. E, embora tenha abatido os egípcios, poupou nossas famílias”. Então todos que ali estavam se prostraram e adoraram.

Este verso ajuda a esclarecer o anterior, Êxodo 12.23, pois orienta os hebreus quanto ao que devem responder aos filhos quando perguntarem sobre o significado da Páscoa.

Portanto, o primeiro sentido da Páscoa é a passagem do Senhor por sobre a terra do Egito. Como disse alguém, é a misericórdia passando sobre um poder destrutivo.

Uma Passagem Protetora

Vamos levar o assunto um pouco mais adiante perguntando: O que, afinal, significou esta passagem do Senhor sobre o seu povo que habitava o Egito?

Alguns sugerem, corretamente, que o verbo passar sobre deve ser entendido como defender, proteger. Desta maneira, o Senhor, ao passar sobre as casas dos hebreus na “casa da servidão”, os cobriu de maneira protetora, como que abrindo as asas sobre eles, como diz Isaías 31.5:

O Senhor dos Exércitos sobrevoará Jerusalém e a protegerá como uma ave protege o ninho. Defenderá e livrará a cidade, passará sobre ela e a salvará. (Note no grifo que é o mesmo verbo “passar sobre” usado três vezes em Êxodo 12).

Assim, Deus não permitiu que o destruidor entrasse nos lares dos hebreus, livrando os primogênitos da morte, no dia anterior ao da libertação do povo das garras escravizadoras do Egito.

A instituição da Páscoa, em Êxodo 12.1-12, nos aponta para o sentido original da festa, que foi a celebração da passagem do Senhor sobre as moradias dos hebreus no Egito a fim de os proteger e defender do anjo exterminador.

O Sentido Atual da Páscoa

A Páscoa judaica perdurou através do tempo e o nosso Senhor Jesus a comemorou segundo as mais antigas e fiéis tradições do seu povo. Mas, como em tudo que fez, Jesus ampliou o significado da Páscoa acrescentando à festa uma interpretação pessoal.

O significado ampliado da Páscoa, dado por Jesus, foi que o cordeiro à mesa não era o animal sacrificado segundo as prescrições antigas. O Cordeiro de Deus estava à mesa e era o próprio Jesus. O Cordeiro de Deus que tira o pecado do mundo.

A partir dessa nova perspectiva todos os elementos que compunham a refeição da Páscoa passaram a ter um novo sentido, especialmente o pão e o vinho, que a partir de então passaram a simbolizar a carne e o sangue do Cordeiro de Deus que tira o pecado do mundo. Além disso, o novo Cordeiro Pascal foi sacrificado, sem dúvida, mas ressurgiu ao terceiro dia. Esta é a mais pura verdade.

Agora sim, a ideia de passagem da Páscoa fica ainda mais clara, pois Deus ao passar sobre nossas vidas e ver o sangue do Cordeiro aspergido sobre nós, nos protege do exterminador, e nossas vidas não sofrerão dano eterno.

O sentido último da Páscoa, para nós cristãos, é a salvação através da obra do Cordeiro de Deus, Jesus, o Cristo, que nos liberta da escravidão do pecado e do reino das trevas para a sua maravilhosa luz.

O primeiro significado da Páscoa, no Antigo Testamento, e o significado ampliado por Jesus, são lições das quais não podemos nos afastar e as quais devemos trazer no coração e na memória e ensinar aos nossos filhos a cada celebração da Páscoa.

O Ensino durante a Celebração da Páscoa

A comemoração da Páscoa em uma refeição festiva e não tem o propósito primeiro de celebrar a comida, mas é a oportunidade de ter a família reunida ao redor da mesa para que os mais velhos possam transmitir o valor e a mensagem salvadora do Senhor.

Essa é a finalidade principal da Páscoa para todas as gerações, conforme lemos em Êxodo 12.24-27:

Lembrem-se de que estas instruções são uma lei que vocês e seus descendentes deverão cumprir para sempre. Quando entrarem na terra que o Senhor prometeu lhes dar, continuarão a realizar essa cerimônia. Então seus filhos perguntarão: “O que significa esta cerimônia?”, e vocês responderão: “É o sacrifício da Páscoa para o Senhor, pois ele passou por sobre as casas dos israelitas no Egito. E, embora tenha abatido os egípcios, poupou nossas famílias”. Então todos que ali estavam se prostraram e adoraram.

Nesse texto a narrativa que deve ser ensinada aos filhos aparece de forma bem resumida, devido à urgência do momento. Mas em Deuteronômio 6.20-25 encontramos a catequese completa sobre o que se deve ensinar no âmbito do lar:

No futuro, seus filhos lhes perguntarão: “O que significam estes preceitos, decretos e estatutos que o Senhor, nosso Deus, lhes deu?”. Então vocês lhes dirão: “Éramos escravos do faraó no Egito, mas o Senhor nos tirou de lá com sua mão forte. O Senhor realizou sinais e maravilhas diante de nossos olhos e enviou castigos terríveis sobre o Egito, o faraó e todo o seu povo. Ele nos tirou do Egito para nos dar esta terra que ele havia prometido sob juramento a nossos antepassados. E o Senhor ordenou que cumpramos todos estes decretos e temamos o Senhor, nosso Deus, para que ele sempre nos abençoe e preserve nossa vida, como tem feito até hoje. Pois a nossa justiça estará em obedecermos cuidadosamente aos mandamentos que o Senhor, nosso Deus, nos ordenou.”

A recordação das maravilhas do Senhor, o que ele fez e tem feito atualmente é o conteúdo que deve ocupar nossa comemoração da Páscoa. Durante a refeição festiva da Páscoa é nosso dever de pais trazer à memória de nossa família as grandezas de Deus e sua atuação libertadora e protetora.

Atualizando este ensino para a perspectiva cristã, precisamos responder aos nossos filhos sobre a continuidade da obra redentora de Deus.

Semelhantemente à catequese de Deuteronômio 6, temos 1 Coríntios 15.3-5, considerado o credo mais antigo da cristandade:

Eu lhes transmiti o que era mais importante e o que também me foi transmitido: Cristo morreu por nossos pecados, como dizem as Escrituras. Ele foi sepultado e ressuscitou no terceiro dia, como dizem as Escrituras. Apareceu a Pedro e, mais tarde, aos Doze.

O conteúdo do que devemos ministrar aos nossos filhos durante a celebração da Páscoa está bem resumido neste texto.

O que eu estou sugerindo com isso é que, durante o almoço de Páscoa, ensinemos e rememoremos para a nossa família o sentido original e mais profundo da festa da Páscoa.

O Cardápio Didático da Páscoa

A refeição pascal, segundo a tradição bíblica, é composta de vários alimentos e cada um deles tem uma função didática específica, ou seja, cada elemento na mesa deve simbolizar uma parte da narrativa que está sendo contada.

Por exemplo, na Páscoa judaica cada alimento tem a sua simbologia na refeição, chamada Seder. Alguns deles são: Ovo cozido: simboliza a lembrança do sacrifício que se oferecia em cada festividade; Pão sem fermento: simboliza a pressa em sair do Egito; Água salgada: simboliza as lágrimas derramadas durante o período de escravidão; Osso de cordeiro: simboliza o poder com que Deus tirou os judeus do Egito e recorda o carneiro pascal; Ervas amargas: simboliza o amargor da escravidão; Massa de nozes, maçã e vinho: simboliza a lama do rio Nilo, com a qual os hebreus faziam os tijolos enquanto eram escravos do Faraó; Vinho: simboliza alegria e felicidade. Há quatro copos de vinho, três para serem bebidos durante a refeição e um para o profeta Elias, aquele que vem anunciar o Messias.

Para nós cristãos, o ponto mais alto do simbolismo da Páscoa se concentra no vinho e no pão, pois estes alimentos receberam uma nova dimensão e significado pelas palavras de Jesus, que disse que aquilo era o seu corpo e o seu sangue dado em favor de muitos.

Claro que não devemos repetir a Páscoa nos moldes dos hebreus do Antigo Testamento, mas podemos procurar analogias de escravidão, sofrimento e libertação em nossos dias, situações na qual a passagem do Senhor sobre nossas casas seja de defesa e proteção. Afinal, a nossa libertação da escravidão do pecado e das trevas já é motivo suficiente para criarmos uma narrativa para a refeição Pascal.

Acho que as seguintes perguntas talvez nos ajudem a compreender melhor o conceito que estou tentando passar. De quais situações amargas ou de raízes de amargura o Senhor nos curou? Quantas lágrimas o Senhor já enxugou de nossos olhos? Quantas vezes Deus já manifestou sua mão poderosa e nos livrou do mal?

Pense nos dias de quarentena pelo qual estamos passando por causa da pandemia do Coronavírus e reflita sobre como Deus tem sido misericordioso com você e sua família. Considere as bênçãos recebidas que você pode narrar aos seus filhos, desde aquelas que parecem mais banais até as mais extraordinárias. Considere isso e vai ver surpreso o quanto Deus já fez.

Uma Páscoa Diferente e Significativa

É a primeira vez que vamos celebrar a Páscoa apenas com nossa família “encolhida”. E isso não é motivo para tristeza ou lamentação. Encare com uma oportunidade dos céus de comemorar a Páscoa de uma forma tão diferente e significativa que seus filhos jamais se esquecerão por toda a sua vida.

Compreenda que o sentido original da Páscoa é a passagem do Senhor sobre sua casa para proteger e guardar a você e sua família e conduzir a todos para uma experiência espiritual inesquecível. Lembre-se que todos os atos à mesa durante o almoço tradicional de Páscoa devem ser acompanhados de uma narrativa de libertação, perdão e comunhão com Deus.

Por isso, escolha os alimentos que de fato tenham algum significado na história de sua família. Algum alimento que simbolize um momento de luta e vitória; algum elemento que lembre a presença de Deus de forma especial; alguma hortaliça que trague à memória dias de provisão em meio a escassez; alguma bebida que represente um encontro familiar que hoje vocês não podem ter. Um cardápio, afinal, que seja repleto de significado, que possa ser expresso em uma narrativa abençoadora para toda sua família nesta Páscoa.

Quando o seu filho ou sua filha perguntar a você o que quer dizer cada alimento na mesa, então você terá a oportunidade de ensinar aos seus filhos o significado da presença de Deus na sua vida e na vida do seu lar.

Feliz Páscoa diferente para você e sua família!

 

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PS.

Se você tem curiosidade de saber como os judeus celebram a Páscoa leia:

O Que é Um Seder? Uma visão geral dos passos do Seder

 

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jrcristofani

José Roberto Cristofani - Casado com Cida Crema Cristofani. Pai, Pastor, Professor de Teologia. Educador, Escritor, Especialista em Educação a Distância e Doutor em Antigo Testamento.